O ato de votar é imprescindível para a formação do estado democrático, que apesar de ser obrigatório, é um direito de cada cidadão. Muitos acreditam que o voto deveria ser facultativo. Talvez devesse, esta é uma questão que merece discussão. A minha opinião é que continue sendo obrigatório, o que garante que todos seremos ouvidos. Penso assim porque duvido da maturidade política do Brasil e com isto não sei se ao deixar a cargo de nossos cidadãos a decisão de votar ou não estaremos correndo o risco de elegermos políticos sem representatividade. Além de que, lutamos muito para conquistar este direito para ficarmos à margem das eleições como se não nos dissesse respeito, como se não tivéssemos nada com isso, não podemos simplesmente lavar as mãos.
Apesar disto, sem hipocrisia, eu confesso que não votei. Não voto na cidade em que moro e devido a um compromisso não pude ir votar, coisa que sempre fiz questão e nunca havia deixado de votar, pelo menos para presidente. Porém, não foi só o compromisso que não me fez ir votar, isso foi apenas um subterfúgio que utilizei para escapar à tarefa de escolher qual candidato eu gostaria que fosse eleito para me representar. Para mim esta decisão se tornou muito difícil devido à crença numa crescente pasteurização na política brasileira que culminou nas atuais eleições.
Estas eleições já me preocupavam já há alguns anos, o Brasil se encontra num momento político, tanto no cenário interno como no internacional, muito bom. Apesar disso, está muito longe de resolvermos nossos problemas e temos um longo caminho ainda a percorrer para que sejamos um país justo, democrático, que atenda as necessidades da sociedade, com instituições sólidas, que tenha uma posição relevante e com influência decisória nas políticas internacionais. Contudo, nos últimos anos temos visto avanços importantes e não podemos pensar em regredir em conquistas importantes.
A pasteurização ocorrida produziu candidatos pouco diferenciados, não existem mais ideologias, programas de governo, correntes políticas divergentes e não há debates sobre forma de se governar. Claro que estou generalizando, temos uns que se dizem socialistas, outros defensores do verde, sociais democratas, os que estão com os trabalhadores, etc. Mas, quais são suas propostas na pratica? O que farão e o que estão dizendo de diferente uns dos outros? Qual a diferença ideológica?
A pasteurização se reflete na prática em falta de coerência, poucos mencionam seus partidos; aberrações se tornam evidentes como Lula e Sarney juntos, Lula apoiando Collor; a candidata do PT tem como vice um representante do PMDB, partido este que há várias eleições não apresenta um candidato à presidente, preferindo ficar ao lado da situação, continuando a ser um partido grande elegendo muitos representantes como governadores e deputados, com isto mantendo uma boa base e se perpetuando no poder; outras aberrações como Lula ao lado de bispos da Universal que antes bradavam em seus cultos que ele era o demônio; candidatos bizarros, como Tiririca, eleitos como voto de protesto resultado da falta de confiança da população nas opções disponíveis; e pior, candidatos envolvidos em escândalos freqüentes que nunca são cassados e proibidos de se elegerem, pagarem por seus atos, então, nem pensar, estes estão aí cheios de votos e são os que sempre se elegem.
Não fui votar porque, sinceramente, não queria nenhuma das opções como meus representantes. Os oito anos de governo Lula me agradaram, foi longe de ser ideal, tenho inúmeras críticas, mas apesar disso não tenho vontade de votar em sua candidata, a figura dela não me agrada, Lula podia bem ter escolhido melhor um candidato para lhe suceder. Nem ela nem as outras opções, me vejo sem escolha, fugi de ir votar. Não existem propostas e conteúdo em que votar, não vejo prós nos candidatos, só contras. Os debates são estéreis, preenchidos por frases e clichês ensaiados, todos muito bem treinados por seus marketeiros com fases politicamente corretas, dizendo o que se acredita ser o que o povo quer ouvir e enfatizando qualidades que seriam suficientes para suprimir seus pontos fracos: Dilma sempre insistindo que tem experiência e que fez o que fez junto com Lula; Serra apostando sempre em sua experiência e batendo na mesma tecla, a da saúde, não podemos esquecer, e ele não deixa, que foi Ministro da Saúde, mas apesar de pequenas concessões que defende ter feito não vemos melhorias reais nesse setor, continua tão deficiente quanto sempre foi; e Marina com sua bandeira ecológica e suas frases bonitinhas, politicamente corretas e vazias de conteúdo, tentando nos convencer de que conseguirá governar sem apoio, no entanto, Plínio num debate dá um banho nela na questão ambiental.
Na falta de um debate sério, na falta de conteúdo, a solução parece que é a velha formula de criar escândalos na véspera das eleições e nesta não vimos nada diferente. Primeiro tentaram nos enfiar um dossiê goela abaixo, não colou; partiram para a quebra de privacidade na Receita Federal, até agora fiquei sem entender que interesse eleitoral Dilma teria na declaração do Imposto de Renda (IR) da filha do Serra e no do ex-Ministro Mendonça de Barros, até onde sei se quiser descobrir coisas ilegais de alguém não será na declaração do IR, parece que esta estratégia não deu resultado positivo, então, veio o escândalo da Casa Civil. Ficou parecendo desespero por uma eleição que, segundo as pesquisas, caminhava para terminar no primeiro turno. As campanhas ficaram tensas, pesadas, desesperadas, então, Serra para mostrar uma imagem mais leve, como se quisesse espantar o desespero, suas últimas edições do programa eleitoral, na televisão, passaram a conter o candidato em forma de desenho animado, bonequinhos de fantoche, quase infantis, cantando musiquinhas leves e sua presença constante acompanhando da família, com sua filha e seus netinhos. Não se falou mais nos escândalos, não na véspera da eleição, a esta altura a tática havia mudado, Serra não era mais visto no JN, horário nobre, bradando a culpa de Dilma, culpa esta que não foi comprovada.
O resultado está aí, os votos foram computados, sobraram dois candidatos, retomemos aos debates e a campanha, vamos aguardar agora o tom do segundo turno, as coligações (coerentes ou não), velhas promessas, repetidas receitas de escândalos, prestem atenção no conteúdo dos discursos como são estéreis, preenchidos por frases feitas; só não esperem por idéias e debates consistentes. Por mim posso dizer uma coisa, apesar de toda esta esterilidade, não posso fazer o mesmo com minhas convicções, hoje quando fui justificar o voto bateu uma crise de consciência por não estar cumprindo o papel que me cabe nas eleições, parece que também terei uma segunda chance, no segundo turno faço questão de ir votar.
Para saber mais:
Tribunal Superior Eleitoral:
Resultados:
Especial G1 sobre as eleições:
Folha especial eleições:
Livro:
Coronelismo, Enxada e Voto – Victor Nunes Leal
Nenhum comentário:
Postar um comentário